Boletim Agrofinanças | nº 22 | janeiro | 2009

 

Clima reduz diferenças regionais e reanima o Cerrado

O impacto provocado pela seca no Sul está reduzindo a diferença dos resultados operacionais dos produtores de grãos do RS, SC e PR em comparação aos produtores do Centro-Oeste, que tinham uma perspectiva sombria de margem em meados de dezembro/08. As quebras na Argentina e no sul do Brasil estão promovendo mudanças na única variável que poderia melhorar os resultados dos produtores endividados em dólar no Cerrado: o preço da soja em Chicago. Em condições normais de safra, a soja com vencimento em maio/09 (referência para os primeiros embarques brasileiros) estaria na casa dos 850 US$/cts, o que seria desastroso para os produtores que operaram contratos a fixar (US$ + 14%) e compraram os defensivos em base cambial.

Esse quadro se alterou muito nos últimos 30 dias, com uma deterioração relativa das contas dos produtores do sul e a gradual recomposição dos resultados dos agricultores do Centro-Oeste. O impacto mais negativo ocorreu na região sul do MS, que foi obrigada a reduzir a tecnologia de plantio e agora também sofre com a falta de água. O efeito combinado desses dois fatores deve empurrar a produtividade da região para níveis abaixo do ano passado, quando a região apresentou perdas substanciais motivadas pelo fraco desempenho de uma variedade de semente de soja largamente utilizada na região. Dois anos de resultados ruins devem impactar substancialmente as contas dos produtores nesta área, assim como a sua capacidade de manter um bom nivel de tecnologia para a próxima safrinha e Safra Verão 2009/10, mesmo que exista a oportunidade de mercado. A realidade já é diferente para a região mais ao norte do estado, que acompanha a situação do sudoeste goiano e sul do Mato Grosso que, salvo problemas pontuais, segue em condições bem mais favoráveis.

O quadro abaixo mostra essa mudança de cenário para os produtores e evidencia o quão volátil é o cenário econômico-financeiro para os produtores de uma maneira geral:


   Fonte: Climasecurity (www.climasecurity.com.br)

Nota: O resultado operacional indicado acima considera a matriz de produção (culturas) e a tecnologia adotadas para essa safra nas diferentes regiões para produtores de médio porte. Seu valor, expresso em %,  é obtido através da divisão do lucro projetado (receita - custos) pelos custos de produção. Os custos de produção incluem: arrendamento da terra (onde é mais freqüente) e despesas pessoais do produtor.

Se observarmos a coluna de Evolução no Período, notamos que a situação se deteriorou mais no oeste do PR (São Miguel do Iguaçu) saindo de um resultado inicial de 20,60% e caindo para -1,44%. Já em Dourados, a deterioração no resultado é mais negativa. Pelo fato desta região ter partido de um valor baixo, o quadro ficou preocupante, com um resultado estimado em -20,34%.

Em Ijuí-RS, apesar da redução de produtividade em relação ao ano passado, o efeito clima foi mais benéfico (até o momento) se compararmos com a referência histórica dos últimos 5 anos de produtividade (excluindo 2005).  Desta forma, o resultado inicialmente projetado para a região até melhorou (24,77%), em relação à Dezembro (+13,46%), pela valorização da produção (soja). Além disso, temos "os melhores preços" da produção de inverno (trigo), que confere mais fôlego (caixa) ao produtor, que ainda não havia vendido toda a colheita de 2008 em dezembro.

No Cerrado, sem o efeito da quebra na maior parte da região, o benefício direto da elevação das cotações em Chicago foi fundamental para conferir novo ânimo aos produtores que não haviam vendido nada ou muito pouco até o momento e captaram recursos em US$ junto às tradings (contratos a fixar), além de terem comprado defensivos indexados ao US$. Os agricultores com esse perfil cultivam a maior área do MT, por exemplo, que estava condenada a sofrer com o aumento do seu endividamento cambial sem a contrapartida do preço. Agora, a solução veio pelo infortúnio alheio. O produtor de Lucas do Rio Verde que não fez troca e operou no modal US$ estava com um resultado projetado de -15,86% e evoluiu para -4,58% . Já o produtor que operou troca recuperou apenas 3,17 p.p., pelo fato de já ter comprometido mais de 56,0% da sua produção em março deste ano. De qualquer forma, a decisão de trocar ainda tem se mantido como a melhor alternativa até o momento para o MT, projetando um resultado de 20,29% na Safra Verão 2008/09 para essa praça.

Em Rio Verde/GO, a recuperação também foi substancial - + 18,41 p.p. - em relação à Dezembro, sendo que com as recentes altas, a região já vendeu em torno de 50,0% da soja a ser colhida. Uma rentabilidade de 29,23%, que somado ao resultado da safra anterior e safrinha, coloca o produtor (do sudoeste goiano em geral) com um bom posicionamento em relação às demais regiões produtoras do país. Historicamente, não é um resultado excelente, poderia ser considerado apenas bom, mas diante do que tínhamos no mês passado, o produtor tem que erguer as mãos para o céu.

As análises apresentadas acima são extraídas dos relatórios do servico Climasecurity, que analisa produtores em 12 regiões do país com atualização semanal de todas as suas contas, ações comerciais, padrão de tecnologia adotado e o efeito clima sobre os seus resultados. Para mais detalhes acesse www.climasecurity.com.br .    
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Troca & Securitização

Para os canais de distribuição do Cerrado que haviam assumido posição especulativa em operações de troca por soja no início do ano passado, com a soja fixada entre US$ 18,50 e US$ 21,00, essa alta de Chicago surge como uma benção divina. Em Novembro, a soja era cotada na casa dos US$ 13,00 (soja balcão) na BR 163. Muitos viram os seus negócios em risco, mas agora já existe certo alívio para a situação. A soja hoje operando a R$ 40,00 já oferece uma saída honrosa para aqueles que não conseguiram hedgear à época, e agora tem a possibilidade de fixar com uma perda pequena ou até uma pequena margem com a indústria de insumos, sobretudo a de defensivos, essa mudança de quadro foi providencial, pois já existiam preparativos para campanhas de descontos agressivos, que talvez não sejam mais necessários. É claro que alguma ajuda ainda será bem vinda, mas perto do quadro de Dezembro, a situação está bem melhor. Não havendo nenhum problema maior com o clima, a liquidação das trocas deverá transcorrer normalmente. No caso do algodão pode haver alguma dificuldade para aqueles produtores do MT que não colherem acima de 300 arrobas/ha. Já na BA a situação é mais folgada com os produtores operando algum lastro herdado da safra 08 que foi positiva sob o ponto de vista de capitalização.

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Crédito & Recebimento


As incertezas climáticas que rondam o sul do país favoreceram o equilibrio das contas no Cerrado. Em Dezembro um produtor que havia negociado financiamento em contrato a fixar junto às tradings estava inviável e o seu fluxo de caixa projetado apresentava problemas de liquidez para os meses de Mar/Abr.  Agora esse quadro amenizou, mas ainda é necessário que esse produtor colha acima de 50 scs/ha para honrar todos os seus compromissos. Em algumas áreas do MT essa produtividade poderá não ser atingida.

Os cotonicultures também enfrentam o desafio de colher bem. No caso dos produtores que aproveitaram as altas do ano passado e conseguiram negociar algum volume acima de 65 US$ cents/lb para entrega no segundo semestre de 2009, é só uma questão de produtividade. Aqueles que não negociaram nada ou que carregam contratos ruins podem ter problemas para saldar os seus compromissos.

No sul os produtores enfrentam problemas, mas têm saldo de caixa remanescente da safra passada, o que ajuda a resolver os seus compromissos sem grandes problemas.

No sul do MS, no entanto, é provável que ocorram problemas de liquidez já que o saldo de caixa da safra anterior foi comprometido com quebras. É recomendável que os credores desenvolvam campanhas de desconto e ou programas de renegociação, pois nem todos terão como saldar as suas contas. O Governo também deve estar atento para esta região que exigirá atenção na safra 09-10, no que tange à concessão de crédito. Problemas logísticos motivados pela situação da COOAGRI devem ser resolvidos até meados de Fevereiro, caso contrário os produtores terão que deslocar a sua produção para pontos de entrega alternativos que podem elevar ainda mais seu custo frete.   

Na cana o quadro é ruim tanto para os produtores como para as Usinas, que em muitos casos já entraram com recuperação judicial. Esse é um momento crítico do ano para as Usinas sob o ponto de vista de fluxo de caixa, pois a maioria não tem disponibilidade de recursos para a sua manutenção. A extensão do prazo de moagem, que muitas estão sendo obrigadas a cumprir, dilui esse problema, mas cria outro em relação às paradas para manutenção que sem dúvida ocorrerão durante o ano todo. Além desse aspecto técnico a qualidade da cana vai se deteriorando à medida que esta fica além do seu tempo normal no campo, reduzindo o seu aproveitamento industrial. É possível que mais usinas apresentem problemas até meados do ano.
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Dinâmica dos Preços

   Fonte: Cepea/Esalq


Soja: O efeito da quebra do Sul e Argentina pressionou os preços e elevaram as cotações em Chicago da casa dos 870 cts/bu para os 1030 cts/bu desde meados de Dezembro. No mercado físico os prêmios melhoraram, o que somado ao câmbio na casa dos R$ 2,30, alçaram os preços da soja balcão, no mercado doméstico, a patamares acima de R$ 40,00/sc na maioria das regiões. Uma bela  recuperação sobretudo no Cerrado, que tinha comprador a R$ 34,00/sc no final de Novembro, e hoje paga R$ 41,00/sc na mesma praça.
   

Milho: O mercado de milho, apesar do estoque de passagem, também reagiu com a forte quebra no RS, o que levará esse mercado a permanecer pressionado até que a safrinha saia da zona de risco. Por outro lado os fornecedores de suínos e aves enfrentam dificuldades na sua cadeia de suprimentos à medida que os exportadores desses gêneros reduziram o seu ritmo de compra. De qualquer forma, apesar desse problema, o segmento milho segue na tendência de alta caso tenhamos algum evento climático adverso sobre a safrinha. É importante ressaltar que os meteorologistas apontam para uma redução das chuvas em fevereiro, o que pode comprometer essa safra, que regulará a oferta do grão em 2009.
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Câmbio

                                     Fonte: Bacen

Ao longo de dezembro/08, o dólar comercial sofreu desvalorização de 0,83%, com cotação média de R$ 2,39/dólar. Já no primeiro dia útil de 2009, houve uma queda de 0,21%, com o dólar fechando a R$ 2,33. No acumulado de 2008, a alta da moeda americana foi de 31,94%, representando um movimento de alta que foi registrado pela última vez em 2002, com a eleição do presidente Lula. Assim como em 2002, considera-se que o novo movimento de alta ocorreu em grande medida pelo medo dos agentes em relação às incertezas do mercado, assim como pela diminuição das negociações, elevando a volatilidade dos mercados.

Apesar dos juros elevados, os maiores do mundo em termos reais, não foi possível atrair recursos para o país, como vinha ocorrendo até então através das operações em que os investidores ganhavam com o diferencial de juros. Essas operações conseguiram manter o real valorizado por muito tempo, porém não se sustentaram com a crise devido à volatilidade do câmbio, que afastou o investidor ao comprometer o seu ganho. Outro fato que promoveu a forte valorização em 2008 decorreu do movimento de desalavancagem, com a repatriação dos recursos espalhados pelo mundo, resultando na valorização do dólar. Além da saída pelo mercado financeiro, a diminuição do saldo comercial também contribuiu para diminuir o fluxo cambial, em que no acumulado do ano, o superávit apresentou o pior resultado desde 2002.

O período foi marcado pela continuidade do estresse nos mercados financeiros internacionais, que teve origem nos EUA e na Europa, com forte repercussão nas economias emergentes. Entretanto, houve uma diminuição da percepção de risco sistêmico após a intervenção realizada pelas autoridades financeiras dos EUA, Europa e Oceania em seus sistemas financeiros, buscando garantir a liquidez nos mercados monetários. A economia global e, particularmente, as economias avançadas enfrentam severa desaceleração, constatando-se recessão em diversos desses países. Para 2009, verifica-se contração nas projeções do PIB real, além de declínio nos índices de inflação. Está havendo retração da demanda global, diminuição da utilização da capacidade instalada e o aumento da taxa de desemprego.

Uma das maiores preocupações do Banco Central do Brasil se refere à inflação, em que no cenário macroeconômico global observa-se uma escassez de crédito, o que tende a reforçar a contração das condições financeiras e, por conseguinte, o risco de intensificação da desaceleração. A economia dos EUA, em particular, entrou em recessão no final de 2007 e continua sofrendo o impacto da crise com efeitos sobre o mercado de trabalho, afetando a confiança dos consumidores. Nas economias maduras, onde a atividade econômica vem se enfraquecendo consideravelmente, as pressões inflacionárias têm mostrado redução rápida. 

A partir desse fato, o Banco Central acredita que a deterioração da economia global tem afastado o fantasma da inflação, o que deu margem para o corte de um ponto percentual na taxa de juros. Apesar da redução, a taxa ainda está muito alta frente ao atual cenário macroecômico, o que poderá
levar a novas reduções na Selic, visto que a inflação também não assusta mais internamente, dada a perspectiva de desaceleração da atividade econômica no Brasil para os próximos meses.
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Viabilidade & Liquidez


Com o ínício da colheita no MT, os produtores da região começam a ter disponibilidade de caixa, o que melhora o índice da região. Nas regiões do Cerrado, onde a colheita ainda não começou, o índice permanece baixo, mas em breve deve reagir, como é o caso da região do Sudoeste Goiano. Já nas regiões do Oeste da Bahia e triângulo mineiro, ainda deve demorar um pouco mais para o produtor gerar caixa da Safra Verão. De uma maneira geral, as tradings estão pouco ativas na compra, mesmo nas regiões onde a colheita está próxima. Existem propostas de compra com prazo diferido (30-60dias), o que está sendo refutado pelos produtores com receio de problemas de liquidez das empresas. A desconfiança agora não é mais unilateral, mas sim mútua.

É normal o Índice de liquidez cair à medida que nos aproximamos da colheita da safra verão, mas esse ano particularmente tem pouco dinheiro fluindo no mercado, o que acentua o quadro. O cenário mais compicado se apresenta no Sul do MS, onde os produtores tiveram dificuldade de acumular caixa nos últimos 2 anos e agora enfrentam uma quebra de safra severa.



 

O quadro melhorou substancialmente em relação ao nosso último relatório. Mesmo com a quebra no Sul (RS-SC-PR) a situação de resultado operacional foi compensada pelos melhores preços. As exceções ficam por conta do PR que no balanço produtividade/preço acabou perdendo um pouco da receita estimada anteriormente, e o Sul do MS que está sofrendo mais. Nesse caso o efeito negativo foi maior já que a quebra é mais severa e os preços na região são inferiores aos preticados no PR. Nos municípios do RS onde predomina a produção de milho, o quadro é pior do que naquelas onde a soja é predominante.

Para o Cerrado a situação do Sul e da Argentina está favorecendo uma forte recuperação nas contas dos produtores, principalmente para aqueles que se endividaram em dólar com fornecedores e financiadores. De fato a elevação das cotações em Chicago seria a única chance de viabilizar um enorme contingente de agricultores. 

Para melhor interpretação dos índices, consulte o seguinte link:
http://www.agrosecurity.com.br/conteudo.php?id=11

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Jurídico

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) decidiu estender a mesma regulamentação aplicável ao registro de ofertas e emissores de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) para as ofertas públicas de distribuição de Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA) e companhias securitizadoras emissoras do papel. Os CRAs só podem ser emitidos por empresas securitizadoras de direitos creditórios do agronegócio, e são lastreados em recebíveis originados de negócios realizados entre produtores rurais, ou suas cooperativas, e terceiros. Já o CRI está atrelado a recebíveis originados pela atividade de financiamento imobiliário. A padronização dos CRAs deve contribuir para aumentar liquidez das negociações do papel. A lei que criou o CRA define que a securitização de direitos creditórios do agronegócio é uma operação pela qual os recebíveis são vinculados à emissão de uma série de títulos de crédito, mediante Termo de Securitização de Direitos Creditórios, emitido pela companhia securitizadora. A securitização de recebíveis do agronegócio tem crescido, constituindo uma forma de o produtor antecipar o pagamento de seus negócios e assim passar a ter uma linha de financiamento.

Fonte: Gazeta Mercantil


Nota: A Agrosecurity não se responsabiliza pelo uso indevido do conteúdo do Boletim para efeito de definição de limite de créditos individuais ou da exposição financeira regional. Por se tratar de uma avaliação do quadro geral (médio) dos aspectos econômicos e financeiros, pode haver divergências significativas da situação real de liquidez e viabilidade de um produtor rural em particular.   

 

 Editorial
   Texto: Fernando Pimentel    Edição: Felipe Prince e Caroline Pereira


 

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